15.8.10

Fios soltos

"-Acho que não esqueço mais o que ouvi.
-Pois é.
-Oh, não! - exclamou Lúcia. - Acabei com tudo? Quer dizer que poderíamos ter continuado amigas, e talvez pela vida toda! E agora acabou!
-Minha filha, já não lhe expliquei uma vez que ninguém sabe o que teria acontecido?"
C. S. Lewis

Não consigo fugir desse eterno descontentamento humano em relação às escolhas que nos levam a caminhos desagradáveis. Não consigo parar de pensar no que teria acontecido se eu tivesse recuado, se eu tivesse avançado. Não consigo porque todas as histórias que ficaram sem fim vão sempre ecoar na minha cabeça, como quando escolhemos entre um lado da bifurcação nunca saberemos aonde a outra estrada levava. Tudo o que eu poderia ter feito, todos os fios que ficaram inacabados no tapete da minha história, ficarão ali, caídos para sempre, sem fazer parte do entrelaçado.

Naquela noite, enquanto todos dormiam, nós sonhávamos acordados. Isolados por nossa ilha de amor em segredo, desfrutando da respiração um do outro. Eu em seus braços fortes, sonolenta e no entanto incapaz de dormir, sentindo seu peito subir e descer tranquilamente, sentindo seu olhar em mim enquanto sua mão gentilmente acariciava meus cabelos. Aquela paz que reinava sobre nossos espíritos... impossível de descrever. Nada mais importava, nada mais existia. Todas as inquietações da mente e mistérios do mundo, calados pelo seu abraço. Toda a frieza e falta de sentimento do homem, toda a imensidão de medos e tragédias, vencidos pelo singelo calor que emanava de seu corpo, me envolvendo como água por entre as pedras do rio. Sentia que o nosso amor podia cobrir todo o universo, ao mesmo tempo que me sentia fora dessa dimensão de espaço. E me pergunto... e se fosse ali, no meio daquela harmonia astral, o meu, dele, nosso primeiro beijo. Se eu tivesse desencostado a cabeça de seu ombro e tocado seus lábios com os meus. Quanto tempo ficamos lá, abraçados, simplesmente coexistindo? Seria suave, pois não tínhamos hora de partir. Teríamos descoberto juntos o desconhecido. Seria pela beleza do momento, e não pela perspectiva da partida. Seria inesperado, mesmo que ansiado. E depois nós poderíamos olhar um para o outro com ternura, ambos com a certeza de que um pertencia ao outro. Trocaríamos sorrisos significativos quando os outros acordassem sem saber de nada. Nos abraçaríamos agradecendo por um ter escolhido o outro. Não nos olharíamos com medo de ser a última vez que isso iria acontecer, mas com uma infinidade de momentos pela frente, a serem vividos de mãos dadas e, quem sabe, bocas unidas.

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